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terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Dez Respirações Minusculas #4

Um som de assobio...
Luzes brilhantes...
Sangue...
Água, correndo sobre a minha cabeça. Eu estou me afogando.

— Demi, acorda! — A voz de Livie puxa-me para fora da escuridão sufocante e de volta para o meu quarto. São três horas da madrugada e eu estou encharcada de suor.
— Obrigado, Livie.
— A qualquer hora. — Ela responde baixinho, e deita ao meu lado. Livie está acostumada a meus pesadelos. Eu raramente passo uma noite sem um. Às vezes eu acordo até a mim mesma. Às vezes começo a hiperventilar e ela tem que despejar um copo de água fria sobre a minha cabeça para me trazer de volta.

Ela não teve que fazer isso hoje à noite.
Hoje é uma boa noite.
Eu fico quieta e imóvel até ouvir a sua respiração lenta e rítmica de novo, e eu agradeço a Deus por não levá-la de mim também. Ele levou todo mundo, mas ele me deixou Livie. Eu gosto de pensar que ele lhe deu a gripe naquela noite para impedi-la de ir ao meu jogo de rugby. Pulmões congestionados e um nariz escorrendo a salvaram.

Salvaram meu único raio de luz.

***

Levanto-me cedo para dizer adeus a Livie em seu primeiro dia em sua nova escola.

 — Você tem toda a papelada? — A lembro. Eu assinei tudo como tutora legal de Livie e fiz ela jurar dizer isso, se alguém perguntar.
— Por que vale a pena...
— Livie, apenas use a história e tudo vai correr bem. —

Para ser honesta, estou um pouco preocupada. Depender da mentira de Livie é como esperar que um castelo de cartas se mantenha em um vendaval. Impossível. Livie não poderia mentir se sua vida dependesse disso. Meio que depende, neste caso. Observo-a terminar seus Cheerios e pegar sua bolsa da escola, empurrando seu cabelo para trás da orelha uma dúzia de vezes. Esse é um de seus muitos tiques. Um que diz que ela está em pânico.

— Basta pensar, Livie. Você pode ser quem quer ser. — Eu ofereço, esfregando seus bíceps quando ela está prestes a se dirigir para fora da porta. Lembro-me de encontrar um pingo de consolo quando nos mudamos para casa da tia Darla e tio Raymond - uma nova escola e pessoas novas que não sabiam nada sobre mim. Eu fui idiota o suficiente para acreditar que a pausa de olhos piedosos iria durar. Mas as notícias viajam rápido em torno de cidades pequenas, e logo encontrei-me almoçando no banheiro ou faltando à escola por completo para evitar os sussurros. Agora, porém, estamos há mundos de distância de Michigan. Nós realmente temos uma chance de começar de novo.

Livie para e se vira para me olhar fixamente.

— Sou Livie Cleary. Eu não estou tentando ser ninguém mais.
— Eu sei. Só quero dizer, ninguém sabe nada sobre o nosso passado aqui. — Esse foi mais um dos nossos pontos de negociação para vir aqui. Minha exigência - não compartilhar nosso passado com ninguém.
— O nosso passado não é o que somos. Eu sou eu e você é você e isso é o que precisamos ser. — Livie me lembra. Ela sai e eu sei exatamente o que ela está pensando. Eu não sou Demi Cleary mais. Eu sou uma concha vazia que faz piadas inapropriadas e não sente nada. Eu sou uma Demi impostora.
***
Quando busquei o nosso apartamento, eu não estava só procurando uma escola decente para Livie. Eu precisava de um ginásio. Não onde meninas magras se pavoneiam em torno de novos equipamentos e ficam perto dos pesos, falando em seu telefone. Um ginásio de lutadores.

Foi assim que eu encontrei o The Breaking Point.
The Breaking Point é do mesmo tamanho que o O'Malleys em Michigan e eu imediatamente me sinto em casa quando eu entro. É completo, com pouca iluminação, um ringue de luta e uma dúzia de sacos de vários tamanhos e pesos, pendurados nas vigas. O ar é infundido com o mau cheiro familiar de suor e agressão - um produto da proporção de 50 homens para uma mulher.

Quando eu entro na sala principal inalo profundamente, acolhendo a segurança que isso traz consigo. Três anos atrás, depois do hospital me liberar dos cuidados a longo prazo - após intensa fisioterapia a fim de reforçar o lado direito do meu corpo, quebrado no acidente - eu entrei para uma academia. Passei horas lá a cada dia, levantando pesos, fazendo cardio, todas as coisas que fortaleceram meu corpo destroçado, mas nada fez para ajudar a minha alma devastada.

Então um dia, um cara chamado Jeff, com mais piercings e tatuagens do que uma estrela do rock cansada, se apresentou.

— Você é muito intensa em seus exercícios. — Disse ele. Eu assenti, sem interesse em qualquer direção que a conversa poderia ir. Até que ele me entregou seu cartão.

 — Você já tentou o O'Malleys abaixo da estrada? Eu ensino kick boxing lá algumas noites por semana.

Sou natural, aparentemente. Eu rapidamente me destaquei como sua pupila, provavelmente porque eu treinei sete dias por semana, sem falhar. Acabou por ser o mecanismo perfeito de enfrentamento para mim. A cada chute e cada soco, eu sou capaz de canalizar a minha raiva, a minha frustração, e minha mágoa em um golpe sólido. Todas as emoções que eu trabalho duro para enterrar na minha vida, eu posso liberar aqui de uma forma não-destrutiva.

Felizmente, o The Breaking Point é barato e eles deixam pagar mês a mês, sem taxas de inscrição. Tenho dinheiro suficiente reservado para um mês. Eu sei que deveria estar indo em direção à comida, mas não me exercitar não é uma opção para mim. A sociedade está melhor comigo em um ginásio.
Depois de me inscrever e obter a grande turnê, eu solto a minha arte em um saco de areia disponível. E sinto seus olhos em mim, os olhares curiosos. Quem é a ruiva? Será que ela não percebe que tipo de academia é essa? Eles estão querendo saber se eu consigo dar uma merda de um soco decente. Eles provavelmente estão fazendo apostas sobre quem me pega no chuveiro primeiro.

Deixe-os tentar.

Eu ignoro a atenção, os comentários flagrantes e risos, enquanto estico meus músculos, com medo de me forçar demais depois de faltar durante três dias. E eu sorrio.
Babacas arrogantes.

Tomando várias respirações para acalmar meus nervos, me foco neste saco, essa coisa graciosa que vai absorver toda a minha dor, meu sofrimento, o meu ódio sem protesto.
E então eu libero tudo.

***

O sol nem mesmo está alto ainda, e a pior espécie de heavy metal antigo explode através do meu quarto. Meu despertador lê 6:00 da manhã. Yup. No horário certo. É o terceiro dia consecutivo que o meu vizinho me acorda desse jeito.

— Mantenha a paz. — Murmuro enquanto puxo minhas cobertas sobre a cabeça, repetindo as palavras de Tanner. Eu acho que manter a paz significa não arrombar a porta do teu vizinho e quebrar teus eletrônicos contra a parede.

Isso não significa que eu não posso exercer vingança.

Pego o meu iPod - uma das poucas posses ‘não-roupas’ que peguei na nossa fuga - e percorro as listas de reprodução. Aqui está. Hannah Montana. Minha melhor amiga, Jenny, carregou toda essa merda adolescente como uma piada anos atrás. Parece que finalmente vai vir a calhar. Eu afasto a dor que vem junto com as memórias vinculadas a ela quando aperto o play e aciono o volume máximo. O som distorcido salta fora das paredes do meu espaço confinado. Os alto-falantes provavelmente vão explodir, mas isso vale a pena.

E então eu danço.

Como uma louca, eu giro ao redor do meu quarto, agitando os braços, esperando que esta pessoa odeie Hannah Montana tanto quanto eu.

— O que você está fazendo? — Livie grita, correndo para o meu quarto em pijamas amarrotados, seu cabelo selvagem. Ela salta para o meu iPod para carregar no botão de desligar.
— Só ensinando ao nosso vizinho uma lição sobre me acordar. Ele é meio babaca. — Ela franze a testa.
— Você o conheceu? Como você sabe que é um homem?
— Porque nenhuma garota ouve essa merda às seis da manhã, Livie.
— Ah. Eu acho que não posso ouvi-lo no meu quarto. — Sua testa franze enquanto ela estuda a parede adjacente. — Isso é terrível.

Dou-lhe uma sobrancelha arqueada.

 — Você acha? Especialmente quando eu trabalhei até as 11 ontem à noite! — Eu comecei o meu primeiro turno em uma Starbucks em um bairro vizinho. Eles estavam desesperados e eu tenho uma carta de referência estelar graças ao meu antigo gerente, filhinho de mamãe de 24 anos chamado Jake com uma queda por ruivas fodonas. Eu fui inteligente o suficiente para jogar bonito com ele.

Valeu a pena.

Com uma pausa e depois um encolher de ombros, Livie grita: — Festa de Dança! — E aumenta o volume.
Nós duas saltamos em torno de meu quarto rindo até ouvirmos o bater em nossa porta da frente.

O rosto de Livie drena de todas as cores. Ela é assim – só ladra, mas não morde. Eu? Eu não estou preocupada. Visto o meu casaco roxo de casa surrado e orgulhosamente avanço. Vamos ver o que ele tem a dizer sobre isso.

Minha mão está sobre a tranca, a ponto de abrir a porta, quando Livie sussurra duramente: — Espere!
Faço uma pausa e viro para encontrar o dedo indicador de Livie balançando, como minha mãe costumava fazer quando ela estava me repreendendo.

 — Lembre-se, você prometeu! Esse era o acordo. Estamos começando do zero aqui, certo? Nova vida? Nova Demi?
— Sim. E?
— E, você pode, por favor, tentar não ser uma rainha do gelo? Tentar ser mais parecida com a Demi de Antes? Você sabe, aquela que não tinha uma parede de pedra contra todo mundo que se aproxima? Quem sabe, talvez possamos fazer alguns amigos aqui. Basta tentar.
— Você quer ser amiga de homens velhos, Livie? Se for esse o caso, poderíamos ter ficado em casa. — Eu digo friamente. Mas suas palavras picam como uma longa agulha inserida direto no meu coração. De qualquer outra pessoa, elas escorregariam no meu duro Teflon exterior. O problema é que eu não sei quem é a Demi de Antes. Eu não me lembro dela. Eu ouvi que suas íris brilhavam quando ela ria, que sua interpretação de “Stairway to Heaven” no piano fazia seu pai chorar. Ela tinha hordas de amigos, e ela sorrateiramente dava abraços e beijos e andava de mãos dadas com seu namorado sempre que podia.

A Demi de Antes morreu há quatro anos e tudo o que resta é uma bagunça. Uma confusão que passou um ano em reabilitação física para reparar seu corpo despedaçado, apenas para ser liberada com uma alma despedaçada. Uma confusão cujas notas desceram para o fundo da classe. Que afundou em um mundo de drogas e álcool por um ano, como forma de enfrentamento. A Demi de Depois não chora, nem uma única lágrima. Eu não tenho certeza se ela sabe fazê-lo. Ela não se abre sobre nada; ela não suporta a sensação de mãos porque a lembram da morte. Ela não deixa as pessoas entrarem, porque dor sempre vem junto. A visão de um piano envia-a em uma névoa vertiginosa. Seu único consolo é bater a merda para fora de sacos de areia gigantes até os nós dos dedos estarem vermelhos e os pés estarem feridos e seu corpo - mantido inteiro com incontáveis hastes de metal e pinos - parecer que vai desmoronar. Eu conheço a Demi de
Depois bem. Para melhor ou para pior, eu tenho certeza que estou presa com ela.

Mas Livie lembra da Demi de Antes e por Livie, vou tentar qualquer coisa. Eu empurro os cantos da minha boca para fora para formar um sorriso. É uma sensação estranha e, pelo estremecimento no rosto de Livie, provavelmente parece um pouco ameaçador.

— Tudo bem. — Eu vou para girar a manivela.
— Espere!
— Deus, Livie! E agora? — Eu suspiro exasperada.
— Aqui. — Ela me dá seu guarda-chuva rosa e preto de bolinhas. — Ele pode ser um assassino em série.

Agora eu inclino minha cabeça para trás e rio. Tal som estranho e raro, porque eu não faço isso muitas vezes, mas é genuíno.
— E o que devo fazer com isso? Picá-lo?
Ela encolhe os ombros. — Melhor do que socá-lo, como você quer fazer.
— Ok, ok, vamos ver com o que estamos lidando aqui. — Eu me inclino para a janela ao lado da porta e empurro a cortina, à procura de um homem grisalho com uma muito pequena t-shirt desbotada e meias pretas. Uma pequena parte de mim desperta com a ideia de que pode ser aquele cara Joe da lavanderia. Aqueles olhos ardentes invadiram meus pensamentos várias vezes sem convite ao longo dos últimos dias, e eu tive alguma dificuldade em expulsá-lo quando ele estava lá. Eu mesmo me peguei olhando para a parede adjacente entre nossos apartamentos como uma aberração, me perguntando o que ele estava fazendo. Mas a música é proveniente do outro lado de modo que não pode ser ele.
Um rabo de cavalo loiro abana para trás e para a frente do lado de fora de nossa porta em vez disso.

— Sério? — Eu ronco, atrapalhando-me com a tranca.

A Barbie está do lado de fora. Não é brincadeira. Uma barbie verdadeira de um metro e 55 centímetros, altamente bronzeada, loira, com lábios cheios e íris gigantes azuis. Eu encontro-me sem palavras, avaliando seus minúsculos shorts de algodão e a forma como o logo da “Play Boy” se distorce ao ser esticado pela sua parte da frente do top.
Aqueles definitivamente não são verdadeiros. Eles são do tamanho de balões de ar quente.

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Hey meninas,como vocês estão? A historia ainda não desenrolou muito e tambem não é comedia romantica como perdida,é um Drama romantico e eu quero saber se está agradando vocês . E em falar em perdida,eu dei altas gargalhadas com a continuação de Perdida.
Bem,pretendo voltar amanha,mais é com voces,comentem,curtam,kibem,deixem a opinião de vocês.
Um beijão 

2 comentários:

  1. Que perfeito ❤️❤️❤️
    Uma patricinha kkk vish 😂😂😂
    Ansiosa para saber se vai ter um barraco com essas duas ou algo do tipo kkk
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    Beijos

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  2. Que perfeito
    Eu amei o capítulo
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