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quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Perdida #4

Foi então que ouvi um “ploct”.

Olhei para baixo bem a tempo de ver meu celular — com todos os meus contatos, minha agenda, minhas músicas — cair do bolso da calça, boiar por dois segundos e depois mergulhar dentro do vaso sanitário.

A luz do sol batendo em meu rosto me acordou. Levei alguns segundos para entender onde eu estava
.
Ai, minha cabeça! Quanto eu bebi ontem?

Olhei em volta com os olhos serrados, o sol fazendo minha cabeça latejar ainda mais. Ah! Meu sofá. Minha sala. Meu apartamento. Fiquei deitada por mais um tempinho tentando, sem sucesso, fazer desaparecer a sensação horrível em meu estômago. Ainda estava com as mesmas roupas da noite passada — porém, sem os sapatos. Sentei-me lentamente, sentindo que talvez minha cabeça pudesse explodir em milhares de pedaços. Fui até a cozinha e tomei dois copos grandes cheios de água e um analgésico — talvez isso limpasse meu organismo e diminuísse o barulho dentro da minha cabeça.

Deixei a água quente do meu super chuveiro cair em meu rosto, enquanto a memória da noite anterior enchia minha cabeça latejante. Evidentemente, a comemoração — da qual o Josh não tinha ideia do que fosse, ainda, mas que comemorou com muito entusiasmo mesmo assim — tinha saído do controle. Eu, claramente, tinha exagerado um pouco. Um pouco demais! Mas não era todo dia que sua melhor amiga resolve ser a namorida de alguém, exatamente na mesma noite em que seu celular se afoga numa privada imunda.

Precisava comprar outro. Urgente! O que uma garota podia fazer sem seu celular?

Fechei o registro do chuveiro e fui me vestir. Dei uma olhada pela janela do quarto e aquela manhã de fevereiro parecia agradavelmente quente. Vesti roupas leves — uma regata branca, saia jeans e tênis de lona; não iria usar saltos numa manhã de sábado nem que a rainha de algum lugar exigisse sob a pena de cortar minha cabeça fora! Dei uma última olhada no espelho, que agora mostrava uma imagem bem melhor que a de quando acordei — meu rosto pálido não tinha mais o tom esverdeado — e passei as mãos nos cabelos para arrumar melhor minhas ondas, não havia muito que eu pudesse fazer a esse respeito, meu cabelo tinha vida própria, não importava o que eu fizesse com ele. Há muito havia desistido da briga. Peguei minha bolsa e tomei mais água antes de sair de casa, ainda não era seguro comer. Esperava encontrar meu novo celular rapidamente. Daria um trabalhão colocar todos os meus dados e arquivos nele, já que não pude enfiar a mão na privada e resgatar ao menos o cartão de memória do meu falecido aparelho.

Constatei, assim que sai do meu prédio, que o dia estava realmente agradável, o sol estava quente e confortável e uma brisa suave trazia o perfume das flores da pequena praça próxima ao meu prédio. Um leve aroma de comida no ar fez meu estômago se agitar um pouco, mas a náusea estava ficando mais suportável. Passei pela praça e notei com estranheza, que havia poucas pessoas ali. Normalmente, sempre ficava cheia de ciclistas e pessoas fazendo suas corridas, famílias com seus filhos correndo na grama e até cachorros levando seus donos para um passeio matinal. Naquela manhã, porém, estava quase deserta. Talvez por que já estivesse perto da hora do almoço, pensei. Entrei na primeira loja e fui direto para o balcão dos celulares. Estranhamente, a loja também estava vazia, apenas uma vendedora ali sem cliente algum. Será que era feriado ou coisa assim e eu não estava sabendo?
Deixei o assunto de lado assim que olhei para a vitrine do balcão. Ah! Tantos modelos, tantas funções e ferramentas, tantas possibilidades ao meu alcance — desde que parcelasse no cartão de crédito, claro. Sentia-me como uma criança numa loja de brinquedos.

A vendedora, a única ali, se aproximou com um sorriso no rosto delicado.

— Procurando por algum modelo em especial, querida? — ela perguntou com sua voz suave.
— Hum... Não. Nem um modelo em particular, pra falar a verdade. Eu preciso de um celular que faça tudo.
Ela arqueou as sobrancelhas escuras.
— Tudo?
— É! Tudo. Mp3, wi-fi, 3G, fotografia e filmagem, agenda, alguns jogos, um bom programa de e-mail, essas coisas. — dei de ombros, tentando não demonstrar o quanto estava desesperada para ter um daqueles monstrinhos em minhas mãos.
— Você precisa que o aparelho tenha todas essas funções? — ela indagou de forma curiosa.
— Precisar mesmo, eu não preciso. Mas se já existe um aparelho que tenha tudo, por que não comprá-lo e aproveitar tudo que ele pode me oferecer? — eu ainda olhava para o balcão cheio de possibilidades brilhantes.
Ela suspirou. Me pareceu uma desaprovação. Olhei para ela e seu rosto pequeno parecia mesmo reprovador.
— Parece que você gosta muito de novas tecnologias. — me lançou um olhar meio triste.
— Claro. Quem não gosta? Esta coisinha salva minha vida quase todo santo dia! — quantos problemas, contratos, rescisões resolvi usando apenas o celular no último mês?
— Ok. — ela disse devagar. — Talvez ele realmente salve algumas vidas em certas situações, seria acho um pouco exagerado dizer...
— Em todas as situações! — eu a corrigi. Tudo dependia do celular. O trabalho, os amigos, minha vida toda gravada na agenda. — Eu não saberia viver sem meu celular ou meu computador — pensei por um momento e acrescentei — Ou o micro-ondas!
Eu ri e esperei que ela fizesse o mesmo, mas a vendedora de cabelos e olhos cinzas e bonitas feições apesar de sua idade uns 50 talvez —, não achou graça na minha brincadeira. Seu rosto de repente ficou pesaroso e eu comecei a ficar um pouco tensa.
— Você tem o que eu quero? — perguntei um pouco apreensiva. Ela estava me deixando um pouco estressada.
— Acho que talvez eu tenha exatamente o que você precisa. — ela disse mais para si mesma. Ou pelo menos foi o que me pareceu.
Ela abriu uma gaveta do balcão e retirou uma caixa pequenina. Prendeu minha atenção totalmente.
— Este modelo não está na vitrine. Esta é a última unidade. — falou, se aproximando mais.

Última?

— É um aparelho muito especial. — ela continuou. Não desgrudei os olhos da caixa. — Muito especial mesmo! Apenas algumas unidades foram fabricadas. É muito raro!

Ah! Droga! Raro significa caro.

— E este está na promoção. Um preço muito bom! Quase me sinto mal por vendê-lo a um valor tão baixo.

Uh!

— E parcelamos no cartão, claro. Além disso, ele possui tudo o que você deseja ou precisa. — ela enfatizou a palavra com um sorriso esquisito na boca. — É fantástico. Aposto que mudará sua vida, querida.
Eu observei a caixa nas mãos dela. As palavras “Everything You Need in Just One Click!”(Tudo que você precisa em apenas um clique) me ganharam.
— Acho que vou levar.
— Tem certeza?

Estava ficando irritada com aquela mulher. Afinal, ela queria ou não me vender o telefone?

—Tenho. — confirmei olhando em seus olhos.

Uma expressão estranha cruzou seu rosto. Pena, tristeza e mais alguma coisa. Será que ela pretendia vender o celular para outra pessoa — uma amiga — e agora teria que me vender a última unidade? Ou será que ela pretendia comprá-lo pra si mesma? Mas, então, por que teria me mostrado o aparelho em primeiro lugar?
— Você não poderá devolver nem trocá-lo! Como eu já disse, este é o último aparelho. — disse suavemente.
— Ele está com algum defeito ou coisa assim? Tem garantia? — perguntei um pouco desconfiada.
— Tem garantia, sim. E não tem defeito algum. Apenas por se tratar de uma peça única não poderá ser trocado, pois não existe outro similar a este!
— Mas ele funciona bem? — me certifiquei.
— Perfeitamente bem. Ele possui tudo o que você sempre quis na vida. Tenho certeza que ficará muito satisfeita. — e sorriu, o rosto alegre.

Que mulher mais sinistra!
— Eu fico com ele então!
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Desculpem a demora,estava esperando os coment's aumentarem,como não rolou postei,comentem. beijos
Nath
#votedemilovato


2 comentários:

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